terça-feira, 10 de março de 2015

Ainda não

Eu não me reconheço. E isso nada tem a ver com os mais de 15 kg extras que tenho desfilado por aí. Eu não me reconheço em minhas atitudes, em meus sentimentos (ou na ausência deles). Posso trazer a baila as mais diversas desculpas, mas a verdade é que não sei o que se passa.

Quando mais nova costumava estufar a barriga em frente ao espelho, simulando sua presença ali dentro. Por vezes até colocava uma almofada sob a roupa, para dar um toque mais realista, tentando visualizar como eu pareceria num estágio mais avançado.

Agora, na reta final sei que aquela imagem eu deveria acrescentar perna, braços, quadril e um rosto cheio. Mesmo sendo menino (e eu no auge do meu egoísmo queria que fosse menino pois diziam que menina "engordava" mais) estou cá um balão. Não que isso seja relevante, pois eu sei que posso reverter esse quadro, mas é o que passa pela minha cabeça no momento. Quanta idiotice.

Bem verdade que também me apavora - muito - o momento em que você chegará nesse mundo. Para isso você terá que nascer e o parto é simplesmente algo assustador demais para que eu consiga imaginar e não ajuda muito estar num lugar completamente estranho, em pleno Oriente Médio (ah, o preconceito nubla a visão e a razão de tal forma que chega a ser ridículo).

As noites insones, tal como essa agora, as dores e esses estranhos movimentos que você faz que me deixam a considerar a viabilidade de fraldas adultas para incontinência urinária, o humor flutuante (se bem que esse eu sempre tive) e a total falta de conexão me poem a questionar se eu de fato fui talhada para isso.

Sempre pensei que estaria radiante. Acreditava piamente que meu mundo giraria em torno de você, afinal, eu sempre gostei de crianças, em particular bebês.

Mas não. Ao fazer o teste de farmácia o sentimento que me invadiu ao visualizar os pontinhos azuis foi pânico. Chorei copiosamente, doído, intercalando falta de ar e curta respiração. Nos meses que se seguiram mergulhei nos detalhes da mudança (sai Macau, entra Mascate), em me adaptar ao novo lugar (rateando muito, bem verdade, me agarrando a pequenas coisas). Arrumei a cozinha, sala, quartos... mas o seu quarto ainda está vazio, com os móveis colocados de qualquer jeito, esperando os detalhes e alguma cor.

Uma coisa é a teoria. Ai que lindo ter um filho! Outra a realidade: Deus, uma criança nesse mundo perdido? Ouvi o tique-taque do relógio, pesei idade e lugar (não imagino melhor lugar do mundo para se ter um filho do que Oman - ou ao menos me convenci disso. Seguro e totalmente voltado para a família, é como se o país girasse em torno da reprodução de seus habitantes).

Estou aqui agora, no seu quarto, pela primeira vez sentada na poltrona que comprei para amamentá-lo. Acho que não tinha passado tanto tempo aqui antes. Entrava, deixava as coisas e saía. Vou precisar de uma almofada para dar suporte as costas.

Poderia por a culpa no fato de ter sido tolhida em muito dos meus devaneios. Tudo era fútil e inútil, boring ou cinza, mas ainda sim, no último mês, foram comprados. Sempre assim, primeiro a guerra, daí o tempo e então a compra como uma novidade super necessária. E eu que tenho a memória fraca.

Estou esperando a comoda e minha mãe. Com a chegada de ambas (quase no mesmo dia), vou poder arrumar as roupinhas (as poucas que consegui comprar e as muitas que vieram de lá), fazer a mala da maternidade, deixar tudo encaminhado.

Engraçado. Estou esperando minha mãe para começar a me sentir mãe. Quero minha família aqui para te receber e oficializar essa nova família. Faz sentido isso? Quero os meus para me sentir igual.

Desculpa filho. Mamãe te ama, só está um pouco perdida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário